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Análise
Covid-19 e embalagem: pesquisador do Ital esclarece sobre contaminação através dos materiais
Segundo órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de SP, vírus resiste mais do que o SARS-CoV-1, mas sanitizantes podem ser eficientes

Por Jaqueline Harumi | Postado em 23/09/2020 11:36:33 | Atualizado em 25/09/2020 08:27:27

Estudos de persistência de vírus em superfícies inanimadas, como embalagens, são escassos, em especial os que avaliam os coronavírus (Crédito: Freepik)

Os três coronavírus que mais preocuparam e preocupam a população global são o SARS-CoV-1, responsável pela pandemia de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) de 2002 com mais de 8 mil mortes, o MERS-CoV, responsável pelo surto de Síndrome Respiratória do Oriente Médio em 2012 com mais de 800 mortes, e o SARS-CoV-2, responsável pela atual pandemia ultrapassando 950 mil mortes, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). E é justamente o novo coronavírus que apresentou maiores persistências em materiais utilizados em embalagens como plástico, metal, papel e papelão ondulado.

Essas observações foram levantadas pelo pesquisador Gustavo Moraes, do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, ponderando, no entanto, que os sanitizantes podem ser eficientes na remoção desses vírus em superfícies inanimadas e lembrando que a principal via de transmissão é entre pessoas, através de gotículas contendo carga viral que são expelidas quando falamos, tossimos ou espirramos.

De acordo com os dados compilados na literatura pelo pesquisador, que é bacharel e mestre em Química e atua no Centro de Tecnologia de Embalagem (Cetea) do Ital, enquanto o SARS-CoV-1 sobreviveu entre quatro e seis dias em plástico e o MERS-CoV entre um e três dias, por exemplo, o novo coronavírus permanece ativo por períodos entre quatro e sete dias nessa superfície. Esses ensaios foram feitos sob condições de temperatura que variaram de 21 a 25 °C e até 50% de umidade relativa (UR) para o SARS-CoV-1, de 20 a 30 °C e 30 a 80% de UR para o MERS-CoV, e 21 a 27 °C e 35 a 65% de UR para o SARS-CoV-2.

Já em metal, o SARS-CoV-1 permanece ativo entre um e cinco dias, enquanto que o MERS-CoV se mantém presente por um a três dias e o SARS-CoV-2 por 8 horas a mais de sete dias, em condições de temperatura e UR semelhantes aos estudos para plástico. Em papelão ondulado, considerando temperatura de 21 a 23 °C e 40% de UR, a persistência na superfície de até dois dias para o SARS-CoV-2 é o dobro da persistência nesse mesmo material para o SARS-CoV-1.

O único material em que o novo coronavírus teve resistência menor em relação ao SARS-CoV-1 foi o vidro, onde durou até quatro dias e o SARS-CoV-1 resistiu até cinco dias, considerando, respectivamente, temperatura variando de 21 °C a 25 °C e 22 °C e umidade relativa do ar de até 65%. Para o papel, um estudo mostra persistência do SARS-CoV-1 por até um dia a 20 °C, enquanto que para o SARS-CoV-2 sua persistência foi observada variando de 3 horas a 5 dias sob temperaturas de 22 a 27 °C e UR de 36 a 65%. Vale lembrar que esse tipo de estudo é escasso na literatura e que os que avaliam a viabilidade dos coronavírus citados são ainda mais escassos para superfícies de papel, papelão ondulado e vidro, o que dificulta a avaliação da maior segurança de um material em relação a outro.

Também foram apresentadas as persistências do SARS-CoV-2 em objetos comuns como cerâmica e máscara cirúrgica por até sete dias, em cédula de dinheiro por até quatro dias, em tecidos por dois a quatro dias e em madeira por até dois dias. “Podemos observar que os materiais porosos tendem a permitir uma persistência mais reduzida do SARS-CoV-2 do que os materiais não porosos”, observa o pesquisador do Ital sobre a variante da natureza do material, tanto em relação à composição química quanto ao estado físico. O pesquisador enfatiza, no entanto, que esse tipo de observação deve ser feito com cautela, dado o reduzido número de estudos disponíveis.

Gustavo Moraes lembra ainda que devem ser considerados fatores como presença de radiação solar e carga viral depositada. “Alguns especialistas dizem que as cargas virais utilizadas nos estudos, de 104 a 107 partículas por mL, são muito mais elevadas em relação ao observado quando alguém espirra ou tosse em alguma superfície, que para o vírus da Influenza, por exemplo, varia de 10 a 100 partículas virais por mL”, diz o especialista, que fez algumas considerações sobre a influência da temperatura e da umidade relativa do ar na persistência do vírus em superfícies.

“Em temperatura de 56 °C e 70 °C, um estudo mostra que o vírus não chega a um dia, já em temperaturas mais amenas, como 22 °C e 37 °C, o vírus chega a permanecer por até 14 dias e dois dias, respectivamente, enquanto que em 4 °C houve pouca variação ao longo dos quatorze dias avaliados”, detalha. “A desativação do vírus é mais rápida para valores de umidade relativa e de temperatura crescentes, o que não quer dizer que em países com umidades relativas e temperaturas altas a propagação do vírus é menor, pois o mecanismo de contaminação é majoritariamente de pessoa para pessoa. Essas observações são válidas apenas no ambiente controlado dos experimentos”, completa.

Novo coronavírus presente nos alimentos?

Uma outra questão esclarecida pelo pesquisador do Ital foram os resultados positivos para o novo coronavírus na China em frangos congelados importados do Brasil na cidade de Shenzhen, em embalagens de camarões importados do Equador em Wuhu e em amostras de frutos do mar em Yantai.

Moraes lembra que medidas restritivas foram tomadas pelo governo chinês mesmo com algumas autoridades sanitárias dizendo que os métodos analíticos empregados detectam apenas a presença do material genético do vírus sem necessariamente em forma viável para infecção: a capital da província de Guangzhou suspendeu a importação de carne, peixe e frutos do mar congelados de países fortemente atingidos pela Covid-19, assim como armazéns e mercados de produtos congelados foram fechados.

Diante do alarme, a OMS emitiu uma nota enfatizando que ainda não existem evidências científicas que comprovem a contaminação através de alimentos e embalagens de alimentos. “O FDA, agência americana análoga à Anvisa, o Food Packaging Forum, organização de comunicação científica na área de embalagens para alimentos, e o Center for Disease Control and Prevetion, associado ao departamento de saúde dos EUA, concordam que não existem evidências científicas que comprovam a contaminação por alimentos ou embalagem de alimentos”, complementou, ponderando que isso não significa a impossibilidade de ocorrência.

Eficácia de sanitizantes

Outro estudo apresentado pelo pesquisador do Ital refere-se aos efeitos de sanitizantes em contato com o novo coronavírus. “Todos se mostraram eficientes após cinco minutos de exposição, menos o sabonete de mão em que uma das três réplicas apresentou carga viral ativa após esse período”, informa. Para o levantamento, foram consideradas as concentrações de 1% e 2% de alvejante, de 2% de sabonete de mãos, de 70% do etanol, de 7,5% Iodopovidona, de 0,5% do cloroxilenol e do gluconato de clorexidina, e de 0,1% do cloreto de benzalcônio.

“O estudo é interessante, porque mostra que grande parte dos sanitizantes são eficientes, mas seria ainda mais interessante mostrar tempos de exposição mais reduzidos, já que na limpeza de superfícies e na lavagem das mãos, normalmente o tempo de contato é menor do que cinco minutos”, observa.