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Regulamentos
Ital lista as principais mudanças regulatórias visando a segurança e qualidade de produtos cárneos
As mais recentes novidades são decreto relacionado à inspeção de animais destinados a abate e consulta pública relativa ao Selo Arte

Por Jaqueline Harumi | Postado em 22/07/2020 10:41:36 | Atualizado em 03/09/2020 14:52:45

Com 44 anos de experiência em qualidade e segurança de carnes e produtos cárneos, o Centro de Tecnologia de Carnes (CTC) do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, ressalta a necessidade de constante observância às questões regulatórias, que passam por importante modernização nos últimos anos.

Os exemplos mais recentes são o Decreto No 10.419 publicado na última semana, definindo a composição da equipe do Serviço de Inspeção Federal (SIF) nas atividades de vistoria em estabelecimentos relacionadas a animais destinados ao abate, e a consulta pública relativa ao Selo Arte aberta até 16 de agosto, com foco nos produtores rurais que fornecem animais para abatedouros frigoríficos, fornecedores de matéria-prima e estabelecimentos fabricantes de produtos artesanais.

Para a pesquisadora e diretora do CTC, Ana Lúcia da Silva Corrêa Lemos, o tema é extenso e o Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) tem demonstrado agilidade nas atualizações, especialmente nos últimos dois anos, o que motivou realizar seminário inédito abordando a temática com público quase três vezes maior do que planejado, no fim do ano passado, incluindo profissionais de entidades setoriais e frigoríficos de diferentes portes de todo o País. “Apesar de os avanços terem sido muitos ainda há muito o que fazer”, pondera.

Os conhecimentos abordados no evento, que contou com três especialistas do Mapa, são listados a seguir pelo CTC, lembrando que o SIF é fundamental para assegurar a qualidade e inocuidade de produtos de origem animal no Brasil e internacionalmente, com primeira regulamentação específica criada há 105 anos. Para os interessados em processos tecnológicos, a unidade especializada do Ital está com inscrições para seu primeiro curso online, abrangendo linguiças frescais, hambúrgueres, produtos reestruturados crus e cortes marinados.

Modernização regulatória

Dentre os avanços já feitos, Maurício Góes Alves, do Mapa, destaca a redefinição de estabelecimentos sob inspeção periódica e permanente, frequências mínimas de fiscalização de acordo com o risco estimado, habilitação por categoria de produtos, alteração do processo de registro de produtos e estabelecimentos, harmonização dos procedimentos de verificação de autocontroles e unificação de formulários de auditoria.

Atualmente, enquanto a indústria é responsável pela qualidade de processos e produtos com desenvolvimento, implantação, manutenção e monitoramento de programas de qualidade higiênico-sanitária, o Governo deve verificar o cumprimento da legislação e avaliação da implantação e execução dos programas de autocontrole.

Alves esclarece que o SIF tem como foco o comércio interestadual e internacional de produtos de origem animal, desde 1948 sob a responsabilidade do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa), lembrando uma dezena de modernização regulatória. A primeira contava com 13 artigos, incluindo inspeção prévia do terreno, planos de instalação, diversificação da produção industrial, mercados de exportação, uso de certificados, acesso do inspetor às dependências industriais, registro da procedência dos animais e procedimentos de inspeção ante post mortem. Já o segundo regulamento, seis anos depois, abrangia 237 artigos, sendo 18 relacionados à inspeção, e ao longo dos anos vieram outros específicos: pescado e derivados, em 1933, leite e derivados e carnes e derivados, em 1934, ovos e derivados, em 1938, e mel e derivados, em 1941.

Dentre outras modificações, destacam-se a extinção dos serviços de inspeção estadual e municipal entre 1971 e 1989, a criação do Laboratório Nacional de Referência Animal (Lanara), em 1978, e a simplificação do processo de elaboração de Regulamento de Identidade e Qualidade de Origem Animal (RTQI), em agosto de 2015, o que estabeleceu rito regulatório em seis etapas: encaminhamento de minuta e dos subsídios, análise, inserção no Sistema de Monitoramento de Atos Normativos (Sisman), retorno da minuta para a Câmara Setorial, realização de Consulta Pública e processamento de contribuições.

A atenção mais recente está na atualização do Marco Regulatório (Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal – Riispoa), em 2017, quando ficaram definidas as responsabilidades pelo auto controle e verificação oficial, houve adequação às novas tecnologias de produção e às evoluções tecnológicas e sanitárias com base em risco, passaram a ter previsão legal os preceitos de bem-estar animal e entraram em cena as medidas cautelares.

Também houve padronização de procedimentos técnicos e administrativos, harmonização com legislação internacional, interação com outros órgãos públicos de fiscalização e compatibilização com o Código de Defesa do Consumidor e o Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (Suasa), além de ordenação didática e simplificação de registro de produtos. Já no ano passado, em março, foi atualizada a legislação sobre aditivos alimentares autorizados para uso em carnes e produtos cárneos através da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n° 272.

Selo Arte

Dentre as regulamentações mais atuais na área de alimentos, está o Selo Arte, que entrou em vigor em junho de 2018 e estabeleceu a obrigatoriedade da prévia fiscalização sob o ponto de vista industrial e sanitário de todos os produtos de origem animal transformados, manipulados, recebidos, acondicionados, depositados e em trânsito que tenham sido produzidos de forma artesanal, permitindo a comercialização interestadual daqueles em que foram empregadas boas práticas agropecuárias e de fabricação desde que fiscalizados por órgãos de saúde pública do Estado.

Lucas Fiuza Moraes, do Mapa, pontua que são abrangidos pelo Selo Arte os produtos em que há predominância de matérias-primas de origem animal de produção própria ou origem determinada a partir de técnicas predominantemente manuais por quem detém o domínio integral do processo, sendo que o produto final deve ser individualizado, genuíno e manter a singularidade e as características tradicionais, culturais e regionais.

Para o cumprimento da lei, o Ministério mantém o Cadastrado Nacional de Produtores Artesanais e deve fazer auditoria, fomentar, elaborar manuais e estabelecer normas técnicas de procedimentos de controle para obtenção de produtos seguros microbiologicamente (Boas Práticas Agropecuárias – BPA e Boas Práticas de Fabricação – BPF), preocupando-se em especial com o bem-estar animal, o que inclui sua saúde, ambiente em que vive, higiene e ordenha, qualidade do leite e treinamento dos colaboradores. Já os produtores devem apresentar relatórios de atendimento aos requisitos e comprovar registro, enquanto os Estados e Distrito Federal devem conceder o selo, fiscalizar produtos com frequência mínima de um ano, elaborar normas e manter atualizados os dados cadastrados

Além disso, através de instrução normativa, foi estabelecido em 23 de dezembro Regulamento Técnico de Boas Práticas Agropecuárias destinadas aos produtores rurais fornecedores de leite para a fabricação de produtos lácteos artesanais, necessárias à concessão do selo. É esse regulamento que hoje está sob consulta pública destinada aos produtores rurais que fornecem animais para abate aos abatedouros frigoríficos fornecedores de matéria-prima e aos estabelecimentos fabricantes de produtos produzidos de forma artesanal.

Inspeção baseada em riscos

Elenita Ruttscheidt Albuquerque, também do Mapa, lembra das vantagens e desafios da implantação das inspeção em suínos baseada em risco, decorrente da Instrução Normativa nº 79, de dezembro de 2018, pois ao longo dos últimos 30 anos tornou-se evidente a necessidade de revisão substancial dos procedimentos para a maioria das autoridades no assunto e organizações governamentais e internacionais como o Codex Alimentarius, da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e Organização Mundial da Saúde (OMS).

Segundo Elenita, a inspeção leva em conta condições de cabeça (papada, músculo e língua), coração, pulmão, vísceras brancas, mesentério, fígado, rins e carcaça antes da morte com o objetivo de diminuir a ocorrência de surtos e otimizar o uso de recursos públicos e privados, mas passou por ajuste do ante e post mortem ao perfil epidemiológico considerando os riscos e perigos, além de identificação e indicação dos procedimentos mais adequados para o controle de cada patógeno. Antes da publicação da nova norma, houve validação através de seis pilotos em plantas de Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, sendo considerados origem do animal, volume de abate, nível tecnológico, sazonalidade e regionalidade.

Resumidamente, os controles na cadeia primária abrangem registro no órgão executor de saúde animal e controle veterinário, envolvendo criação independente ou vinculada de suínos comerciais, terminados e de confinamento, com informações obtidas através de boletim sanitário, que inclui rastreabilidade desde o nascimento e registros sanitários. Dentre as preocupações na recepção, estão separação dos animais que tiverem alterações individuais e abate de emergência considerando o bem-estar animal (BEA). Na inspeção dos lotes e exame individual pré-abate, também são considerados exame em busca de doenças populacionais de relevância econômica e verificação do Programa de Autocontrole (PAC) quanto à prevenção de contaminação do abate.

Assim, os requisitos para estabelecimentos incluem instalações, equipamentos e fluxos adequados e aprovados, quadro técnico competente com médico veterinário responsável registrado e treinado, programa desenvolvido e validado de avaliação e classificação de suínos, carcaças e partes de carcaça e vísceras, e controles microbiológicos e laboratoriais em relação às carcaças.

Qualidade, segurança do alimento, segurança alimentar, fraude e defesa

A diretora de Segurança dos Alimentos e Garantia da Qualidade da JBS, Ivone Delazari, esclarece conceitos importantes quando se trata de segurança e qualidade dos alimentos. Enquanto a qualidade do alimento refere-se ao conjunto de atributos que define o grau de aceitação pelo consumidor, a segurança do alimento se aplica à inocuidade para prevenção de doenças de origem alimentar, diferente da segurança alimentar, que está ligado ao acesso físico e econômico a alimentos em quantidade suficientes, seguros e nutritivos, de modo a satisfazer necessidades e preferências, garantindo uma vida saudável.

A fraude, por sua vez, está relacionada a ato intencional de substituição, adição, adulteração ou deturpação de alimento, ingrediente alimentício ou embalagem de alimento para ganho econômico ou evasão fiscal e contrabando. Por fim, a defesa do alimento se direciona ao esforço de proteção do alimento ou de fontes alimentares contra a adulteração onde existe a intenção de causar mal às pessoas e aos negócio, com contaminações na maior parte desconhecidas, portanto sendo necessário pensar como o agressor para evitá-la.

Dentro desse contexto, a Lei de Modernização da Segurança de Alimentos (FSMA) da Food and Drug Administration (FDA), aprovada em 2011, com regulamentação sobre adulteração intencional de maio de 2016, considera que as instalações de alimentos e bebidas regulamentadas devem preparar plano de defesa com avaliação de vulnerabilidades, considerando que as mais significativas, se exploradas, podem causar danos em larga escala na saúde pública, para  garantir que sejam minimizadas ou evitadas através de estratégias de mitigação em etapas acionáveis.

Padrões Microbiológicos

Quase 20 anos após aprovado, o Regulamento Técnico sobre Padrões Microbiológicos para Alimentos teve revisão publicada no ano passado. Original de janeiro de 2001, a norma é destinada aos produtos alimentícios apresentados ao consumidor final até o último dia do prazo de validade. A revisão foi inclusa na agenda regulatória em 2015, com 14 reuniões do Grupo de Trabalho sobre aspectos gerais e critérios específicos até 2017 e outras duas após consultas públicas em 2018 e 2019, seguidas de reunião geral.

Foram considerados âmbito de aplicação, microrganismos, categorias de alimentos, amostragem, metodologias analíticas e diretrizes para aplicação, sendo estabelecido como critério microbiológico as condições para aceitabilidade do produto, do lote de alimento ou do processo em relação a ausência ou presença de microrganismos, sua quantidade ou a quantidade de toxinas/metabólitos que possui.

Instrução Normativa estabeleceu lista de padrões para todos os alimentos, exceto os comercialmente estéreis, um específico para Listeria monocytogenes em alimentos prontos para consumo e um específico para os comercialmente estéreis, como leite e derivados UAT (UHT). Os métodos alternativos podem ser usados desde que validados por estudos comparativos intra e inter laboratoriais, que certifiquem que os resultados obtidos sejam equivalentes.

A cadeia produtiva deve não só investigar causas dos insatisfatórios e satisfatórios com qualidade intermediária, mas também implementar ações corretivas necessárias para evitar repetição. Havendo risco para a saúde humana, deve avaliar a segurança do consumo de outros lotes que possam ter sido impactados pela causa determinada da contaminação, lembrando que para as doenças transmitidas por alimentos (DTAs) devem ser considerados dados clínicos e epidemiológicos, conforme determinações do Ministério da Saúde.

Rotulagem Nutricional

Em discussão desde junho de 2014 através de Grupo de Trabalho na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), propostas regulatórias relativas à rotulagem nutricional dos alimentos embalados estão sob análise da Diretoria Colegiada após consulta pública realizada entre 12 de setembro e 9 de dezembro com 82.046 contribuições.

Defendendo um modelo mais informativo e eficiente, a Rede Rotulagem, formada por 20 entidades setoriais, considerou como principais pontos de atenção à proposta da Anvisa a legibilidade da tabela nutricional e do modelo de rotulagem nutricional frontal (FOP), pois são vários os formatos e tamanhos de embalagens, exigindo modelos alternativos, e o perfil nutricional, pois muitas vezes 100g/ml não mostra diferenciação entre produtos de uma mesma categoria, podendo desestimular melhorias.